domingo, junho 28, 2009

Zenabre

"Está criando zenabre!" O tema da conversa era uma pulseira, espécie de bracelete, que estaria começando a perder a cor original. Não era comigo mas ouvi e reconheci logo a palavra, tão comum nos tempos da infância.
Diz-se de qualquer objecto de metal que comece a oxidar, adquirindo um tom esverdeado e um cheiro diferente, que está com zenabre.
A pulseira em questão era muito bonita mas de pechisbeque. O ouro e a prata não criam zenabre.

quarta-feira, junho 24, 2009

Para sarar o imbigo dos bebés

Era no dia de São João, antes de o sol sair, que se resolvia antigamente o problema dos umbigos que não saravam. A essas hérnias no umbigo dos bebés, as pessoas chamavam "imbigo roto" e não hesitavam em pedir ajuda ao São João, seguindo um complexo ritual que garantiam dar resultado positivo.
Eram escolhidas duas crianças, um rapaz e uma rapariga, sendo que ele tinha obrigatoriamente de se chamar João e ela Maria. Durante a madrugada, dirigiam-se até um local onde não passasse ninguém e existissem vimieiros. Aí era escolhido um vime que se abria a meio, de cima abaixo, com o cuidado de deixar a ponta inteira e de mantê-lo na planta.
Após estes preparativos, Maria e João colocavam-se um de cada lado do vimieiro e iam passando o bebé de um para o outro por entre a abertura no vime. Enquanto o faziam tinham de repetir o seguinte: " - Que me dás, Maria?/ - Que me dás, João?/ - Um menino roto. / - Para me dares um são." Não me lembro de quantas vezes era necessário repetir estas palavras, mas julgo que eram três.
Terminado este ritual, as duas partes do vime eram cuidadosamente ligadas e enquanto se voltavam a unir, o umbigo da criança ia também sarando, até ficar perfeito.
A receita só resultava se tudo fosse feito durante a madrugada do dia de São João, num lugar onde não fosse habitual passar gente, e por duas crianças, um João e uma Maria.

terça-feira, junho 23, 2009

A sorte dos cardos


Não sei se ainda se fazem sortes na véspera de São João. Na minha adolescência, experimentei quase todas, afinal havia tempo e disponibilidade. Havia também um caminho desconhecido que apetecia tentar adivinhar e o santo tinha o poder de dar algumas pistas importantes. Uma delas era o nome da pessoa com quem se haveria de casar.
Certa vez, decidi fazer a sorte dos cardos. Durante o dia, procurei uma planta de cardos, que não era nada difícil de encontrar, algures entre poios e bardos, e apanhava três flores. À noitinha, por entre a algazarra dos rapazes e raparigas saltando à fogueira, velhos búzios tocando e o crepitar de louro verde ardendo, aproximei-me do fogo e queimei as pequenas pétalas de cor lilás dos três cardos. De seguida procurei um lugar para os plantar.
Os três cardos foram plantados ao lado uns dos outros, num lugar que só eu sabia e onde estes não corriam o risco de serem estragados. A cada um atribuí o nome de um rapaz, sendo que a um deles tive orbigatoriamente de atribuir o nome do santo, João. Os outros dois nomes, mandava a tradição, foram escolhidos entre possíveis pretendentes.
No dia seguinte, logo de manhã, lembro-me de correr até ao local onde estavam plantados os cardos. Espantosamente, havia um deles que tinha florescido durante a noite. Segundo a crença popular era esse o sinal que indicava o nome do futuro marido. Pequenas pétalas de cor lilás refilavam no cardo e eu fiquei fascinada com aquela espécie de milagre do santo e da Natureza.
Não casei com nenhum dos dois possíveis pretendentes. Saiu-me o nome do Santo.

quinta-feira, junho 18, 2009

boquejar

- "Falámos um bom bocado mas ela não boquejou nada".
E não tendo boquejado nada sobre o caso de que já muitos falavam, a interlocutora fez de conta que nada ouvira, que nada sabia.
"Boquejar" significa revelar, desvendar algo que se reveste de algum secretismo, normalmente algo inesperado, algo que não convém deixar passar para as "bocas do mundo". E porque não é desejável, nem convém, são precisamente esses os factos que mais rapidamente chegam aos ouvidos e às bocas das bilhardeiras.

sábado, junho 13, 2009

Picar a imagem de Santo António

" - Pobrezinho, ele está todo picado!" A Dona Adelaide olha com ternura para a imagem de Santo António e volta a dizer "coitado, tem os pezinhos todos picados com alfinetes." Nunca se socorreu dessa artimanha para conseguir arranjar marido, aquele ar condoído é sincero, puro.
Mas muitas outras raparigas solteiras, sem olhar a meios para conseguir os fins, usaram o antigo método das picadas com alfinetes para coagir o Santo a arranjar-lhes marido, afinal não há outro santo casamenteiro. Dona Adelaide encolhe os ombros e ouve-se-lhe uma voz doce mas triste: "dizem que sim, parece que resulta". Sorri e continua calmamente a enfeitar com flores brancas e perfumadas o andor do santo que não lhe arranjou marido. Fico a olhá-la em silêncio e apetece-me dizer-lhe que fez bem, afinal qual é o sentido de obter seja o que for recorrendo à tortura? Porém não digo nada nem pergunto nada, não tenho coragem de tentar confirmar as minhas suspeitas. Limito-me a agradecer as explicações e vou embora. Há coisas que parecem difíceis de compreender e talvez tenham uma explicação tão simples como esta história do alfinete. Talvez. Tal como a Dona Adelaide, não sou capaz de recorrer à tortura.

terça-feira, junho 09, 2009

alguém que nos quer bem

Sabemos que alguém nos quer bem quando sonhamos um um cão. Mesmo que sejamos perseguidos pelo cão, mesmo que ele seja feroz e nos morda, seja o que for que sonhemos envolvendo um cão é um bom sinal: quer dizem que alguém nos quer bem.
Sonhei com cães e lembrei-me que esta era uma das muitas sentenças que a minha avó repetia numa enorme lista de interpretação de sonhos guardada apenas na memória. Depois da minha avó, é agora a minha mãe que repete esses ensinamentos que explicam os sonhos à boa maneira popular. Espero ser eu a perpetuar na família estes pequenos dizeres, crenças que não fazem mal a ninguém e nos aproximam da memória das gerações que nos antecederam.

domingo, junho 07, 2009

virar o pão ao contrário

Uma superstição antiga ensinava que nunca se devia virar o pão ao contrário, porque dava azar. Não sei porque a fixei no meio de tantas outras, nem sempre a memória guarda o que é mais importante, ela tem também os seus estranhos caprichos.
Sei que não tenho qualquer tipo de explicação para este receio de virar o pão ao contrário. Lembro-me que a minha avó benzia sempre o pão, antes de o meter no forno, será que tem algo a ver com isso?

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