sábado, setembro 20, 2008

A rica e a pobre

No silêncio da memória, surpreendo o cantarolar de uma cantiga da infância, que na verdade era também um jogo.
Uma das crianças representava o papel de rica, outra de pobre, à volta da qual se colocavam as restantes crianças presentes, no papel de filhas. A pobre era quem começava, dando uma passo em frente. Quando terminava, recuava e a outra avançava para cantar a sua parte.

pobre - "Eu sou pobre, pobre, pobre
de maré, maré, maré
rica - "Eu sou rica, rica, rica
de maré, maré, maré

pobre - "A senhora o que deseja
muito atira, atira rá (repete os dois versos)
rica - "Desejo uma das suas filhas
muito atira, atira rá (repete)

pobre - "A senhora o que lhe dá?
muito atira, atira rá (repete)
rica - "Dou-lhe uma fita para o cabelo
muito atira, atira , rá (repete)

A pobre vira-se para uma das crianças e finge que lhe pergunta, depois responde.

pobre - "Ela disse que não queria,
muito atira, atira, rá (repete)

Então, a rica continua a oferecer objectos (lembro-me de cantarmos, por exemplo, que lhe dava uns sapatos de ouro, uma pulseira, um cordão, um vestido novo, tudo o que quiséssemos....) até que a criança decide aceitar e passa para o lado da rica.
Por exemplo:

rica - "Dou-lhe um vestido novo
muito atira, atira, rá" (repete)
pobre - "Ela disse que lhe agrada
muito atira, atira, rá (repete)

O jogo e as cantigas repetem-se até que a pobre fique sem nenhuma das filhas, entretanto dadas à rica, que as vai atraindo com a promessa de presentes raros.

Comments:
Olá Lília!
Não conheci este jogo-cantiga, mas ao lê-lo lembro-me da "condessa condessinha",que eu gostava e ficava a pensar que vida boa não seria casar e ficar sentada numa almofada enfiando continhas de ouro... A minha preguiça vem de longe!
Um beijo
miss
 
Não será dando seguimento a essa cantiga-jogo que os políticos «roubam» os filhos dos pobres com tretas e mais tretas...?


«Roubar» aqui significando (ou querendo significar) «explorar»!
 
Cara Lília Mata: Creio ter conseguido uma interpretação para os termos "de marré" e "de marré deci". Publiquei-os no artigo"Interpretação textual de um jogo tradicional cantado", na Revista de História da Biblioteca Nacional, edição on-line, Janeiro 2009, Rio de Janeiro. Apreciaria muito contar com o seu comentário crítico. Cordialmente, Avelino Medina.
 
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