domingo, outubro 01, 2006

Piolho, piolho, piolho.

Era uma vez um homem conhecido pela alcunha de Piolho. Alcunha ou apelido, como dizem as gentes da minha terra. Ora, sempre que reinava com o marido, a mulher entendia de o chamar Piolho e ele ficava irritado.
O homem ficava irritado, mas quanto mais irritado ficava mais ela o chamava de Piolho.
Um dia o Piolho perdeu a paciência e decidiu que nesse dia a brincadeira ia acabar. A mulher ia deixar de o tratar por Piolho, desse por onde desse. Mas por mais que lhe ordenasse que não repetisse a alcunha, ela repetia e repetia, não havia maneira de parar.
Chegou a um ponto em que o homem levou a mulher para a roda de um poço. Aí, perguntou-lhe: "Ainda sou Piolho?" E a mulher, inflexível: "Sim senhor, és Piolho, Piolho, Piolho." A cena tomou tais proporções que o PIolho acabou atirando a mulher para dentro do poço. Então, voltou a perguntar: "Ainda sou Piolho?" E ela, sem hesitar sequer: "És Piolho, Piolho, Piolho."
A mulher foi começando a se afundar, mas ainda assim sempre que vinha à tona e o homem lhe fazia a pergunta, repetia: "Piolho, Piolho, Piolho." Até que o afundamento se tornou mais sério, e ela já não conseguia falar, porque não conseguia por a cabeça fora da água. Então, colocou os dois braços fora da água, funtou as duas unhas dos dedos polegares e fez o gesto de quem mata um piolho. Seguiu a sua avante até ao fim.
Sempre que alguém mostra sinais de extrema teimosia, ouço uma alusão a esta história. Já nem é contada, porque é do domínio geral. Basta a expressão: "Piolho, Piolho, Piolho". E já está dito o que se pensa da pessoa e do comportamento em causa. Que é uma teimosia.
A história só volta a ser totalmente contada quando estão presentes crianças, que adoram ouvi-la e deliram com ela, no caso de se tratarem de pessoas de fora, que não têm semelhante história nas suas raízes culturais, ou, por último, tratando-se de alguém como eu, que quer à fortça capatar todos os pormenores, para aqui os registar, mesmo correndo o risco de ser chamada, como há bocado, de "pessoa muito aborrecida."

Comments:
descobri o seu blog hoje, e gostei dele imenso: tenha, pois, por certo, que não é aborrecida. para além disso, hei-de dizer-lhe que a história da teimosa e o piolho de sempre a conta a minha mãe, e antes do que ela o meu avô, e todos nós somos galegos e na galiza vivemos. um saudozinho.
 
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