terça-feira, setembro 19, 2006

Quem dá aos pobres, empresta a Deus.

Este era um dos ditados preferidos da minha avolita. E ela não se ficava pela teoria. Todos os dias passavam no nosso sítio muitos pobrezinhos, sobretudo de Machico e do Caniçal, e ela ficava com pena de todos.
A minha avolita não tinha quase nada, a comida escasseava para alimentar a casa de dez pessoas, mas ela ninguém passava naquele terreiro sem saciar a fome ou levar alguma coisa. Parecia que ela fazia um verdadeiro milagre de multiplicação.
Muito crente em Deus, na virgem e em todos os santos possíveis, a minha avolita dava aos pobres porque "quem dá aos pobres empresta a Deus". O pago haveria de chegar, mais tarde ou mais cedo. Fiando-se na justiça divina, passou este ensinamento a todos os filhos.
"Quem dá os pobres, Deus depara o dobro", disse ela ao meu tio João, que era o menino da casa, num certo dia em que passou por aqui um pobre do Caniçal. "Ah, João, dá ao pobrezinho aquele dinheiro que tu tens. Olha que Deus ajuda. Ele depara o dobro daquilo que se dá aos pobres."
O meu tio ouviu aquilo, fez contas de cabeça e depressa concluiu que ficaria a ganhar com aquele negócio com Deus. Tinha quatro escudos. Ora, se Deus dava a dobrar, ficaria com oito escudos, nada mau!
Foi buscar o dinheiro que tinha em cima do toucador e deu-o ao pobrezinho do Caniçal, contente com o primeiro bom negócio da sua vida. O pobrezinho foi embora, contente também, e o meu tio ficou à espera que se cumprisse a segunda parte do negócio: a parte em que Deus lhe deparava o dobro. O dia foi avançando, avançando....e nada.
O meu tio João foi ficando preocupado, cada vez mais preocupado, até que desatou numa choradeira infernal. Chorou quanto pôde até que a minha avó se viu obrigada a lhe dar os oito escudos que ele estava à espera de receber de Deus.
Esta história aconteceu há perto de sessenta anos, e nunca mais foi esquecida. De vez em quanto, lá está alguém a recordar o caso dos quatro escudos que o meu tio deu ao pobrezinho do Caniçal, porque a minha avó o convenceu de que Deus deparava o dobro.
O meu tio era criança e não entendeu a metáfora. É verdade que Deus dá o dobro. Dá em alegria, dá naquilo que se sente quando se consegue ajudar alguém que realmente precise. E quem tiver dúvidas que pergunte aos Criadores de Sorrisos .

Comments:
4 escudos há sessenta anos era mto dinheiro...
o pobre ja nao ficou mto mal...
e tu..nao me queres dar nada?? eheh Olha que Deus dá-te em dobro =)*
 
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