segunda-feira, maio 15, 2006
Os pesquitos
Antigamente, uma das primeiras palavras do vocabulário das crianças, era "Peeeeeixe", gritado à maneira dos muitos pesquitos que passavam no sítio a vender peixe. "Era pesquitos como chuva. Um gritava ali, outro acolá em baixo, outro lá além", recorda a minha mãe. Por fim, as pessoas já conheciam os pesquitos pela voz com que gritavam. Sabiam à distância qual era o rabujento e qual era o mais careiro.
Os de Câmara de Lobos passavam com o peixe dentro de celhas, carregadas às costas, e a eles as pessoas chamavam os "xarnotas", que imagino um sinónimo de "xavelhas". As más-línguas diziam que eles "mijavam" no peixe para ele ter a aparência de fresco, vá-se lá saber se era verdade ou não.
Os pesquitos que vinham do Caniço, das zonas da beira-mar, traziam o peixe em dois canastros de cana, pendurados num cajado, um de cada lado. Eram normalmente rapazes novos, de 13, 14 anos, que iam embora deixando o peixe pendurado num prego sobre a lareira da cozinha da minha avolita, mesmo depois de ela ter garantido que não queria peixe nenhum nesse dia. "Não faz mal, fica a dever". E num abrir e fechar de olhos desapareciam deixando o peixe no prego da cozinha.
"Era tudo por quantia, aqui e na praça." Claro, não havia balanças. Lembro-me de ver o pesquito descansando a celha no chãozinho do Cabouco. Mal recebia a encomenda começaca a contar os chicharros, enquanto os enfiava num vime ou numa erva rija, entrando numa guelra e saindo na boca, ou ao contrário, não posso precisar.
Eles contavam muito depressa e quem estava a ver perdia a conta, não conseguia acompanhá-los. "Contavam por avanço." As pessoas ficavam convencidas de que estavam a trazer mais peixe do que aquele que estavam a pagar. "No fim, os pesquitos diziam sempre: mais um para o gato. Mas quando as pessoas iam ver, não tinha nem um a mais."`É por isso que no meu sítio ainda hoje, quando alguém conta muito depressa, se afirma: "Parece que está enfiando peixe." E invariavelmente a memória se perde nesses tempos em que não havia frigoríficos, nem supermercados, nem sequer balanças, e todos os dias passavam por aqui pesquitos como chuva.
Os de Câmara de Lobos passavam com o peixe dentro de celhas, carregadas às costas, e a eles as pessoas chamavam os "xarnotas", que imagino um sinónimo de "xavelhas". As más-línguas diziam que eles "mijavam" no peixe para ele ter a aparência de fresco, vá-se lá saber se era verdade ou não.
Os pesquitos que vinham do Caniço, das zonas da beira-mar, traziam o peixe em dois canastros de cana, pendurados num cajado, um de cada lado. Eram normalmente rapazes novos, de 13, 14 anos, que iam embora deixando o peixe pendurado num prego sobre a lareira da cozinha da minha avolita, mesmo depois de ela ter garantido que não queria peixe nenhum nesse dia. "Não faz mal, fica a dever". E num abrir e fechar de olhos desapareciam deixando o peixe no prego da cozinha.
"Era tudo por quantia, aqui e na praça." Claro, não havia balanças. Lembro-me de ver o pesquito descansando a celha no chãozinho do Cabouco. Mal recebia a encomenda começaca a contar os chicharros, enquanto os enfiava num vime ou numa erva rija, entrando numa guelra e saindo na boca, ou ao contrário, não posso precisar.
Eles contavam muito depressa e quem estava a ver perdia a conta, não conseguia acompanhá-los. "Contavam por avanço." As pessoas ficavam convencidas de que estavam a trazer mais peixe do que aquele que estavam a pagar. "No fim, os pesquitos diziam sempre: mais um para o gato. Mas quando as pessoas iam ver, não tinha nem um a mais."`É por isso que no meu sítio ainda hoje, quando alguém conta muito depressa, se afirma: "Parece que está enfiando peixe." E invariavelmente a memória se perde nesses tempos em que não havia frigoríficos, nem supermercados, nem sequer balanças, e todos os dias passavam por aqui pesquitos como chuva.