quinta-feira, maio 11, 2006
O indês
" - Fica um?" " - Fica, que é para a galinha pôr mais." Sem me aperceber, usei uma expressão que me deve ter ficado gravada na infância, no tempo em que as galinhas andavam soltas e faziam ninhos escondidos nos bardos e nos matos, e era preciso ter o cuidado de deixar sempre um ovo no ninho, para a galinha não o enjeitar.
A esse ovo, deixado de propósito, para evitar que a galinha, cacarejando muito e de forma zangada, fosse construir outro ninho, quem sabe em local de mais difícil acesso, chamava-se o "indês".
Não passava pela cabeça de ninguém esquecer o "indês". Os ovos eram preciosos para vender, ou para uso da casa, e era uma pena quando se perdiam porque ninguém tinha dado com o ninho. Ainda há relativamente pouco tempo foi o que aconteceu com os ovos de duas galinhas que sairam ao meu pai numa rifa comprada no bazar da festa da Senhora da Paz.
Uma das galinhas fez o ninho debaixo da pereira que fica à frente da casa dos meus avolits, por debaixo de uns matos acumulados junto ao tronco. So foi encontrado tempos depois, cheio de ovos, que já não puderam ser utilizados.
A outra escolheu um local ainda mais inacessível: no meio das abobareiras que cresciam debaixo da ameixeira que ficava adiante do chiqueiro. Só muito tempo depois, quando estavam a cavar a terra, cairam os ovos todos de uma vez desse ninho nunca descoberto a tempo.
As palheiras eram piores do que as galinhas, sem comparação! Faziam os ninhos em locais tão bem escondidos, que quando as pessoas se precatavam, elas apareciam "pelo terreiro p'ra lá, com uma ninhada atrás". Estepilha.
Lembro-me de um facto engraçado, que acontecia em casa dos meus avolitos: as galinhas tinham a mania de fazer ninho no canto da lenha, o espaço que ficava ao lado da lareira, por baixo de um armário de madeira contruído a partir de meia parede, e que servia para guardar a lenha e o mato utilizados para cozinhar, porque o comer era todo feito no lar.
As galinhas faziam o ninho no "canto da lenha", que maravilha, nada mais fácil de descobrir. Desde que se deixasse o indês, nãoeram pecisos mais cuidados, a não ser quando se ia retirar ou colocar a lenha, para não os partir ou não assustar a galinha.
O habito do indês era cumprido tão religiosamete por toda a gente, que um dia o meu tio João recebeu amêndoas pela páscoa - um luxo só cumprido com o menino da baboseira, o mais novo da casa - e uma das primeiras coisas que fez foi colocar um dos ovinhos, assim se chamavam as amêndoas, precisamente no canto da lenha.
Quando lhe perguntaram porque o fez, respondeu, desembaraçado: "Pa gla pô mais". Ainda mal sabia falar, mas já se apercebera desse hábito de deixar o indês para garantir que as galinhas não deixavam de pôr os ovos no ninho conhecido.
A esse ovo, deixado de propósito, para evitar que a galinha, cacarejando muito e de forma zangada, fosse construir outro ninho, quem sabe em local de mais difícil acesso, chamava-se o "indês".
Não passava pela cabeça de ninguém esquecer o "indês". Os ovos eram preciosos para vender, ou para uso da casa, e era uma pena quando se perdiam porque ninguém tinha dado com o ninho. Ainda há relativamente pouco tempo foi o que aconteceu com os ovos de duas galinhas que sairam ao meu pai numa rifa comprada no bazar da festa da Senhora da Paz.
Uma das galinhas fez o ninho debaixo da pereira que fica à frente da casa dos meus avolits, por debaixo de uns matos acumulados junto ao tronco. So foi encontrado tempos depois, cheio de ovos, que já não puderam ser utilizados.
A outra escolheu um local ainda mais inacessível: no meio das abobareiras que cresciam debaixo da ameixeira que ficava adiante do chiqueiro. Só muito tempo depois, quando estavam a cavar a terra, cairam os ovos todos de uma vez desse ninho nunca descoberto a tempo.
As palheiras eram piores do que as galinhas, sem comparação! Faziam os ninhos em locais tão bem escondidos, que quando as pessoas se precatavam, elas apareciam "pelo terreiro p'ra lá, com uma ninhada atrás". Estepilha.
Lembro-me de um facto engraçado, que acontecia em casa dos meus avolitos: as galinhas tinham a mania de fazer ninho no canto da lenha, o espaço que ficava ao lado da lareira, por baixo de um armário de madeira contruído a partir de meia parede, e que servia para guardar a lenha e o mato utilizados para cozinhar, porque o comer era todo feito no lar.
As galinhas faziam o ninho no "canto da lenha", que maravilha, nada mais fácil de descobrir. Desde que se deixasse o indês, nãoeram pecisos mais cuidados, a não ser quando se ia retirar ou colocar a lenha, para não os partir ou não assustar a galinha.
O habito do indês era cumprido tão religiosamete por toda a gente, que um dia o meu tio João recebeu amêndoas pela páscoa - um luxo só cumprido com o menino da baboseira, o mais novo da casa - e uma das primeiras coisas que fez foi colocar um dos ovinhos, assim se chamavam as amêndoas, precisamente no canto da lenha.
Quando lhe perguntaram porque o fez, respondeu, desembaraçado: "Pa gla pô mais". Ainda mal sabia falar, mas já se apercebera desse hábito de deixar o indês para garantir que as galinhas não deixavam de pôr os ovos no ninho conhecido.
Comments:
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Adorei esta história, não conhecia ou já não me lembro de ter ouvido essa palavra "indês", mas lembro-me de termos de deixar um ovo no ninho para a galinha por mais e não podíamos tocar no ovo que ficava para a galinha não enjeitar.
Como e' interessante a similaridade, quase que unicidade, do mundo lusofono. A palavra indes me passou pela cabeca "sem mais nem porque". Eu vim `a internet pra' averiguar se "indes" levava um "s" ou um "z". Me deparei com esta cronica. Comecei a desfrutar e reviver a minha infancia em cada detalhe. Isso e' tao relaxante quando se vive no exterior. Pensei comigo "deve ser alguem do Sudeste brasileiro que cresceu em uma cidade pequena como eu...". Somente estranhei que a liguagem usada era bonita e pomposa. Me lembrava "Machado de Assis". Ate' que me deparei com o verbete "facto". Um momento!!! Nao se soletra "facto" dessa maneira no Brasil. Descobri Lilia Mata do Funchal, Madeira, Portugal. Como e' possivel que as tradicoes e os costumes rurais sejam tao semelhantes? ricado grillo
chicago2paris@gmail.com
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Houve uma vez em que minha mãe não quis mais galinhas no quintal. Havia no quintal um capim alto e denso que passou a ser usado para “quarar” os lençois. Os lençois eram postos de molho em um tacho de água com muito sabão e depois estendidos sobre o capim debaixo do sol . Ficavam branquinhos. Meu Deus quanto trabalho!!! Hoje passeando pelas aléias dos supermercados, eu encontro pelo menos 10 qualidades de alvejantes: Para roupa colorida, roupa branca, que fere a mão, que não fere a mão, líquido, pó, gelatinoso. Contudo, para minha mãe era o capim embaixo e o sol do meio-dia em cima. Mas, por infelicidade, a vizinha do lado era muito liberal com suas aves. Suas galinhas se espalhavam pela rua e por toda a vizinhaça. Com um vôo baixo e esforçado, penetravam os quintais a despeito das cercas ou muros. E os lençois de minha mãe acabavam bem alvejados, contudo decorados com a estampa de “pés de galinha”... Uma vez, nós crianças encontramos por ali um ninho. Pelo menos oito ou nove ovos. A algazarra foi geral. Tão forte a gritaria que até a vizinha escutou. No dia seguinte ela veio a nossa casa para pedir de volta os “seus” ovos. Minha mãe se desculpou e lhe disse que haviam todos sido usados para um grande omelete na noite anterior em comemoração à descoberta. Depois desse ocorrido, minha mãe freqüentemente “construía” um ninho no meio das aboboreiras e o enchia com ovos comprados no mercado. Quando chegávamos da escola, nos sugeria que procurássemos por mais ovos. Novamente os ovos eram encontrados e a algazarra era geral. Ela nos levava bem próximos à cerca para ter certeza de que a vizinha escutava o burburinho. O plano funcionou. Em menos de um mês, o quintal da vizinha estava fechado com cerca e tela de arames. E os lençois de minha mãe alvos como a neve. ricardo grillo chicago2paris@gmail.com
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