quinta-feira, setembro 08, 2005

Sábados sem sol

A propósito do dote das raparigas, lembrei-de deste provérbio: "Não há sábado sem sol, nem há noiva sem lençol."
Tal como todas as noivas tinham um dote, onde obrigatoriamente constavam alguns pares de lençóis, alguns bordados, outros com uma barra de crochet, dizia-se que todos os sábados tinham ao menos alguns momentos de sol.
E porquê? Porque o sábado era o dia das arrumações. Todo o dia de sábado era dedicado a fazer voltas e em nossa casa cumpria-se essa tradição à risca.
Ao sábado punha-se tudo na rua, mudava-se a roupa da cama, varria-se e lavava-se, e por vezes ariava-se o terreiro e as passadas. Lembro-me, por exemplo, de colocarmos em cima do murinho do terreiro todos os sapatos e depois de os limparmos e darmos pomada.
Era um dia em que não se parava. Os cobertores eram postos a assoalhar e as colchões também. Era uma azáfama constante e terminávamos o dia sempre cansadas mas contentes, com o chão a cheirar a cera, as camas a roupa lavada, e flores frescas nas jarras.
Claro que tudo se complicava quando chovia, sobretudo se a chuva começasse a cair quando já estavam abertas todas as portas e janelas da casa e pelo terreiro espalhados inúmeros objectos. Lembro-me de ouvir dizer: "O sol ainda vai abrir o olho. Não há sábado sem sol nem há noiva sem lençol." Não fiz nenhum estudo aprofundado que agora me permita garantir que era verdade.
Tenho saudades desses sábados, em que tudo era certo, até o sol.
Há dezoito anos, desde que trabalho, que os meus sábados são incertos. Em grande parte deles tenho trabalhado, tal como os domingos. Trabalho de trabalho. O trabalho de todos os dias e não aquele trabalho de antigamente, as arrumações que ao fim do dia nos deixavam aquela sensação de cansaço feliz.
Hoje não tenho dias definidos para arrumações e tenho a certeza de que nada na vida é certo, nem sequer os lençóis das noivas e os sábados com sol. Com essas certezas, ainda que fossem as únicas, viver parecia mais fácil.

Comments:
Eu também já tive essas rotinas,quando a minha mãe ainda estava junto de mim...tambem sinto saudades,hoje nem Sabádos,nem Domingos,nem dia nenhum!!Porque será que só damos valor ás coisas que já não temos?Até mesmo uma rotina que por vezes causava aborrecimento cá em casa,hoje me faz falta...
 
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Não há sabado sem sol, nem domingo sem missa nem segunda sem preguiça
 
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