sexta-feira, março 11, 2005
Piolante singelo ou dobrado
Os campos estão cheios de pequenas flores amarelas. Estão tão bonitos! Na verdade, aquilo que os faz tão bonitos é uma simples erva, o piolante. Sempre gostei deste primeiro sinal da próxima estação. Continuo a adorar esta antecipação da Primavera. Em criança, deliciava-me a apanhar ramos dessas flores amarelas, de caule frágil, e com elas enfeitava pequenos frascos vazios e sem utilidade para os adultos, transformando-os em verdadeiras jarras.
Outra coisa que fazia ao piolante era comer-lhe os caules azedos. Mastigava-os, deliciando-me com o sabor azedo, mas não engolia o que restava do caule, quando já não passava de uma pasta verde. Era tão bom e nunca percebi que me fizesse mal comer caules de piolante. Há pouco tempo, a propósito desta recordação, a minha mãe confessou-me que também comeu piolante em criança.
Então lembrei-me que havia dois tipos de piolante, um de flores singelas e mais claras, que é o que existe agora em abundância; e outro de um amarelo mais escuro, com as flores dobradas, com pequenas rosas. Em criança, admirava mais as flores dobradas. Agora, gosto mais das singelas, apesar de serem elas as mais comuns.
Mas é na variedade que está a riqueza e ainda ontem senti o coração apertado porque ainda não tinha visto, este ano, piolante de flores dobradas. Pus-me a olhar para todos os poios e bermas de caminho por onde fui passando, e quando já estava quase a perder a esperança, julgo ter visto um pé de piolante de flores dobradas. Não sei se foi imaginação provocada pelo desejo de o ver. Espero que seja real, que ainda existam dos dois tipos de piolante, que deram um sabor diferente à minha infância e criaram em mim simpatia pelo amarelo, num sentimento de justiça apenas intuitivo, pois nessa altura ainda não sabia que quase ninguém gosta dessa cor e não percebi o espanto de toda a gente quando um dia a minha mãe foi à cidade e me perguntou, antes de sair de casa, de que cor eu queria o casaco que pretendia comprar-me. Respondi, sem a mínima hesitação: "Amarelo". Todos os adultos se espantaram e se riram com a forma decidida como eu escolhi a cor do meu primeiro casaco. A minha mãe fez-me a vontade e comprou-me um casaco amarelo-canário, que tinha pequenas galinhas desenhadas nos botões.
Comments:
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Suponho que, aqui, no continente, se dá o nome de azedas ao piolante. Não conheço os de flor dobrada, mas vou estar mais atenta e tentar descobrir.
Azedas (Oxalis pes-caprae). Mas o nome madeirense tem muito mais piada... Também na minha infância era costume tricar o caule destas plantas e chupar o suco ácido. E este texto veio reavivar exactamente essas memórias, pelo que agradeço à autora.
Quanto às azedas, há belíssimas fotografias em http://arquivonatural.naturlink.pt/azeda.htm, de onde usei em tempos uma para um poeminha que fiz a estas singelas flores de um amarelo vibrante.
No prado de azedas -
Oscilam sinetas mudas
Sobre a erva baixa.
A brisa fria da tarde
Suspira entre a folhagem.
É possível lê-lo em http://sitiodoshaikais.blogspot.com no arquivo do mês de Janeiro de 2004 (sem a foto).
Parabéns por este belo blogue
Quanto às azedas, há belíssimas fotografias em http://arquivonatural.naturlink.pt/azeda.htm, de onde usei em tempos uma para um poeminha que fiz a estas singelas flores de um amarelo vibrante.
No prado de azedas -
Oscilam sinetas mudas
Sobre a erva baixa.
A brisa fria da tarde
Suspira entre a folhagem.
É possível lê-lo em http://sitiodoshaikais.blogspot.com no arquivo do mês de Janeiro de 2004 (sem a foto).
Parabéns por este belo blogue
Desconhecia a designação piolante à erva que no Porto da Cruz se chamava "erva da referta". E porquê? Referta é um sítio quase serrano, e esta erva estendia-se por todos os seus vinhedos salpicando aquelas encostas de amarelo. Com as flores dessa erva, nós miúdos tingiamos o cordel do pião que cá na Madeira se chama guita.
Na minha terra chamamos azeda, e como era tao bom chupar o suco dos caules, mesmo aquele sabor azedo sabia bem naquelas tardes de Verao... ai que saudades...
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