quinta-feira, fevereiro 17, 2005
Olhar e Andar para casar
Antigamente, as pessoas "andavam para casar" em vez de namorarem ou noivarem. Primeiro, "olhavam", no adro da igreja, nas procissões, no caminho para a venda ou na debulha do trigo. Depois o rapaz ia "pedir a rapariga" e, se ela o aceitasse, "começavam a andar para casar". O casamento acontecia normalmente e ao fim de oito a dez anos, depois de terem feito casa. Se o noivado, por algum motivo, terminava, diziam "acabou-se o casamento". Lembrei-me de colocar aqui estas palavras a propósito de um dia que não existia nesse tempo, que é o de São Valentim. O santo "casamenteiro" era o Santo Antonio.
Aqui fica uma conversa sobre namoro, noivado e casamento, que tive com o senhor João de Nóbrega Chícharo, do Sítio da Tendeira, Caniço, também conhecido por João da Matilde. Vi-o uma única vez, no Verão de 1992. A minha tia Romana estava de férias na Madeira e trazia recomendações dos familiares do senhor João, também emigrados na Venezuela, para que lhe fizesse uma visita. Acompanhei-a nessa visita e conversei com ele. Depois escrevi este texto, que foi premiado no suplemento jovem do Diário de Notícias de Lisboa. O senhor João era bastante idoso e, entretanto, faleceu.
"Eu já a conhecia desde que se era pequenos. Mas comecei a olhar para ela quando se ia levar o leite à máquina para desnatar. Só falei com ela uma vez. Ela disse-me: 'Vai-me pedir a meu pai.' Ora, eu fui e ele mandou-me voltar daí a oito dias buscar a resposta. Era tudo assim naquele tempo.
Eu voltei no dia marcado e já fiquei lá para a ceia. Não me esqueço, era papas de farinha de trigo num alguidar só para aquela casa de gente. Era cada um com a sua colher, naquela mesa grande, à volta do alguidar das papas.
Depois andava-se para casar; eu ia lá às quintas-feiras e aos domingos, como era de moda. Cumprimentava-se um ao outro com uma mãozada, não era nada como agora. Acha que se andava aos beijos com nestas novelas que dá na televisão? Nem pensar! Eu dei-lhe um beijo uma vez mas foi às escondidas. Deus me livrasse se o pai dela soubesse.
E mesmo mais ela não deixava; cá se ela quisesse... Sabe o que é que eu digo? Que hoje, só de se ver na televisão goza-se mais que naquele tempo vivendo. Também não se caminhava sozinhos. Isso! A primeira vez que eu saí mais ela fomos à serra buscar lã de ovelha para se fazer a cama dos noivos.
- Foi feliz no seu casamento?
- Então não fui!
- Porque é que não voltou a casar depois de ter ficado
viúvo?
- Menina, casar e morrer é uma vez só. E além do mais eu
já estou velho. Acha que eu ia casar com uma rapariga mais nova para os outros terem mulher?"
Aqui fica uma conversa sobre namoro, noivado e casamento, que tive com o senhor João de Nóbrega Chícharo, do Sítio da Tendeira, Caniço, também conhecido por João da Matilde. Vi-o uma única vez, no Verão de 1992. A minha tia Romana estava de férias na Madeira e trazia recomendações dos familiares do senhor João, também emigrados na Venezuela, para que lhe fizesse uma visita. Acompanhei-a nessa visita e conversei com ele. Depois escrevi este texto, que foi premiado no suplemento jovem do Diário de Notícias de Lisboa. O senhor João era bastante idoso e, entretanto, faleceu.
"Eu já a conhecia desde que se era pequenos. Mas comecei a olhar para ela quando se ia levar o leite à máquina para desnatar. Só falei com ela uma vez. Ela disse-me: 'Vai-me pedir a meu pai.' Ora, eu fui e ele mandou-me voltar daí a oito dias buscar a resposta. Era tudo assim naquele tempo.
Eu voltei no dia marcado e já fiquei lá para a ceia. Não me esqueço, era papas de farinha de trigo num alguidar só para aquela casa de gente. Era cada um com a sua colher, naquela mesa grande, à volta do alguidar das papas.
Depois andava-se para casar; eu ia lá às quintas-feiras e aos domingos, como era de moda. Cumprimentava-se um ao outro com uma mãozada, não era nada como agora. Acha que se andava aos beijos com nestas novelas que dá na televisão? Nem pensar! Eu dei-lhe um beijo uma vez mas foi às escondidas. Deus me livrasse se o pai dela soubesse.
E mesmo mais ela não deixava; cá se ela quisesse... Sabe o que é que eu digo? Que hoje, só de se ver na televisão goza-se mais que naquele tempo vivendo. Também não se caminhava sozinhos. Isso! A primeira vez que eu saí mais ela fomos à serra buscar lã de ovelha para se fazer a cama dos noivos.
- Foi feliz no seu casamento?
- Então não fui!
- Porque é que não voltou a casar depois de ter ficado
viúvo?
- Menina, casar e morrer é uma vez só. E além do mais eu
já estou velho. Acha que eu ia casar com uma rapariga mais nova para os outros terem mulher?"
Comments:
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Lembro-me muito bem da expressão. Era costume dizer-se o João do Ribeiro olha para a josezinha do Coelho. olha para = namora. Porque de facto o namorar era sinónimo de olhar. Só podia haver aproximação se houvesse pedido de casamento.
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