segunda-feira, janeiro 03, 2005
Estar lá com a mão nos olhos
"Mesmo ela já tá lá c'a mão nos olhos à tua espera". Esta expressão é uma deliciosa ironia. Traduzindo: É evidente que ela/ele não anseia pela tua visita. Este "estar com a mão nos olhos" não é o gesto de tapar os olhos, mas sim o de colocar a mão, aberta e na horizontal, à frente dos olhos, para fazer sombra e melhor enxergar ao longe. É um gesto de quem espera e desespera, com ansiedade, pela chegada de alguém. É um gesto que talvez já quase ninguém faça actualmente, porque as pessoas, quando estão para chegar, não se conseguem avistar ao longe, percorrendo as veredas, aproximando-se pouco a pouco, ora bem visíveis, adivinhando-se o cansaço pelo ritmo da marcha, ora ocultadas pelas curvas dos caminhos, pelos lombos das montanhas, pelas árvores e pelas casas. Aparecendo e desaparecendo ante os nossos olhos, como num truque de magia.
Agora as pessoas chegam de carro e anunciam-se através de telemóveis cada vez mais sofisticados ou de campaínhas de apartamentos, também cada vez mais evoluídas. Por isso é que este "estar lá com a mão nos olhos" soa agora tão estranho. Os mais novos, para entenderem a expressão, precisam que ela seja explicada. Precisam que se fale com vagar desse tempo em que se demorava muito mais a chegar e talvez por isso as chegadas fossem mais desejadas. Desse tempo em que as pessoas não se importavam de perder algum do seu tempo, permanecendo com a mão aberta à frente dos olhos, numa espécie de pala a fazer sombra, mirando para longe, à espera de um vulto, que reconheciam pela roupa, pela estatura, pela maneira de andar, ou pelo quedado, pelo comprimento e pela cor do cabelo. Era lindo, esse tempo! Era lindo as pessoas ficarem com a mão nos olhos à procura de alguém no horizonte.
"Olha lá ele não 'tá lá com a mão nos olhos". Ouvir esta expressão entristece-nos e normalmente abre-nos os olhos para uma realidade que preferíamos ignorar. É horrível quando tentam matar-nos uma ilusão. Há algo que salva esta expressão. Felizmente. O que a salva é a memória do gesto de colocar a mão nos olhos e procurar alguém ao longe, pequenino primeiro, depois aumentando de tamanho aos poucos, ora aparecenddo, ora desaparecendo, mas sempre se aproximando. A expressão irónica magoa; a original faz-nos saudades. Ainda bem que voltei a ouvir, há pouco tempo: "Olha lá, ela não 'tá lá c'a mão nos olhos à tua espera!"
Agora as pessoas chegam de carro e anunciam-se através de telemóveis cada vez mais sofisticados ou de campaínhas de apartamentos, também cada vez mais evoluídas. Por isso é que este "estar lá com a mão nos olhos" soa agora tão estranho. Os mais novos, para entenderem a expressão, precisam que ela seja explicada. Precisam que se fale com vagar desse tempo em que se demorava muito mais a chegar e talvez por isso as chegadas fossem mais desejadas. Desse tempo em que as pessoas não se importavam de perder algum do seu tempo, permanecendo com a mão aberta à frente dos olhos, numa espécie de pala a fazer sombra, mirando para longe, à espera de um vulto, que reconheciam pela roupa, pela estatura, pela maneira de andar, ou pelo quedado, pelo comprimento e pela cor do cabelo. Era lindo, esse tempo! Era lindo as pessoas ficarem com a mão nos olhos à procura de alguém no horizonte.
"Olha lá ele não 'tá lá com a mão nos olhos". Ouvir esta expressão entristece-nos e normalmente abre-nos os olhos para uma realidade que preferíamos ignorar. É horrível quando tentam matar-nos uma ilusão. Há algo que salva esta expressão. Felizmente. O que a salva é a memória do gesto de colocar a mão nos olhos e procurar alguém ao longe, pequenino primeiro, depois aumentando de tamanho aos poucos, ora aparecenddo, ora desaparecendo, mas sempre se aproximando. A expressão irónica magoa; a original faz-nos saudades. Ainda bem que voltei a ouvir, há pouco tempo: "Olha lá, ela não 'tá lá c'a mão nos olhos à tua espera!"